domingo, 12 de julho de 2009

Vídeos gravados por aliados de Beto Richa levantam mais suspeitas contra o prefeito


JOSÉ MASCHIO
da Agência Folha, em Londrina
DIMITRI DO VALLE
da Agência Folha, em Curitiba

Um vídeo gravado por dois auxiliares diretos do prefeito de Curitiba, Beto Richa (PSDB), para tentar desqualificar denúncias de irregularidades na campanha eleitoral que reelegeu o tucano em 2008, acabou por levantar mais suspeitas sobre a existência de um suposto caixa dois na campanha.
O vídeo foi gravado pelo procurador-geral do município, Ivan Bonilha, e pelo diretor de Transportes da URBS (empresa municipal que administra o transporte coletivo), Fernando Ghignone. Na gravação, eles conversam com o ex-gerente comercial da construtora Piemonte, Rodrigo Oriente.
Oriente trabalhou em um comitê de apoio a Richa em 2008. Foi ele quem levou à Procuradoria Regional Eleitoral, no fim do mês passado, a acusação de que esse comitê supostamente recebeu recursos de caixa dois --o que detonou uma crise na administração tucana. A Piemonte, empresa de loteamentos que atua em Curitiba, pertence a holding Plenaventura e foi a terceira maior doadora da campanha de Richa em 2008.
Nas eleições daquele ano, Ghignone era o coordenador financeiro da campanha de Richa e Bonilha era o advogado tucano da campanha. Com mais de três horas de gravação, o vídeo registra conversas entre eles e Oriente em 10, 11 e 13 de junho deste ano. As gravações foram feitas no escritório da distribuidora de livros de Ghignone. No dia 22, quando a acusação de caixa dois chegou ao jornais, o PSDB divulgou uma edição de 11 minutos do vídeo, em que Oriente fala que existia ''pressão'' de opositores de Richa para que as denúncias fossem feitas.
A íntegra do vídeo, no entanto, mostra que Oriente também citou na conversa uma série de outros supostos casos de corrupção na Prefeitura de Curitiba e de fraudes na arrecadação de IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano) para alimentar a campanha tucana. Oriente afirma a seus interlocutores que enumerou 26 casos de crimes ambientais e urbanos em depoimento ao Nurce (Núcleo de Repressão ao Crime Econômico), órgão da Polícia Civil do Paraná.
Ao ouvirem as denúncias, Bonilha e Ghignone dizem que ''irão tomar providências''. A íntegra da fita foi entregue à Folha pelo próprio Richa, que também a encaminhou ao MPF (Ministério Público Federal). Na gravação, Oriente diz que a Piemonte negociou com Richa --entre o final de 2007 e o início de 2008-- que a arrecadação de IPTU de 6.220 terrenos em um loteamento não fosse para os cofres públicos, mas sim para a campanha tucana. ''A prefeitura lança o IPTU para a Piemonte, a Piemonte pega aquele IPTU e, em vez de pagar, resolve não pagar, ficar com o dinheiro. Então foi feito um acordo, que eu participei dele com o prefeito, em que a Piemonte iria doar esse dinheiro para a campanha."
O esquema gerou R$ 334 mil para a campanha de Richa, diz Oriente. Ele afirma que R$ 200 mil foram o comitê central de Richa e o restante foi entregue a comitês pró-Richa espalhados pelos bairros de Curitiba. Segundo ele, o dinheiro nem saiu dos cofres da Piemonte, que cobrou o IPTU dos compradores de lotes. A prestação de contas de Richa ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral) aponta a Piemonte como doadora de R$ 201 mil à sua candidatura.
Ouvido ontem pela Folha, Oriente reafirmou sua versão e disse que o montante não declarado ao TRE foi para o caixa dois da campanha. A seus interlocutores no vídeo Oriente diz que a Piemonte subornou um funcionário municipal para aterrar a nascente de um rio na zona sul de Curitiba para implantar um loteamento com 479 lotes.
A assessoria de Richa, membros da coordenação de sua campanha à reeleição e a direção da empresa Piemonte contestaram as afirmações do ex-gerente comercial Rodrigo Oriente. Todos negam a veracidade das denúncias apresentadas por ele nas gravações. Eles questionaram por que Oriente não trouxe a público os documentos que afirma dispor para comprovar as denúncias que apresentou à polícia.
O diretor-geral da Piemonte, Rui Demeterco, classificou as denúncias de "levianas". De acordo com o empresário, Oriente coordenava uma equipe de vendas de lotes e jamais participou de reuniões que decidiam os rumos da empresa. Demeterco disse que os repasses à campanha de Richa foram declarados à Justiça Eleitoral. Ele apontou como "loucura" as afirmações de Oriente sobre supostas negociações envolvendo uso de dinheiro do IPTU de moradores de um loteamento na campanha tucana.
Oriente foi demitido da Piemonte no ano passado, após seis anos de empresa, mas o empresário disse que não iria dar detalhes sobre os motivos da dispensa. Fernando Ghignone, que atuou na coordenação financeira da campanha de Richa, diz que as gravações foram feitas em seu escritório para comprovar eventual "achaque" de Oriente, o que não aconteceu.
O procurador-geral de Curitiba, Ivan Bonilha, disse que determinou a instauração de 14 sindicâncias administrativas após as conversas que ele e Ghignone tiveram com Oriente. Segundo Bonilha, Oriente disse que apresentaria documentos que comprovariam suas acusações, o que não teria ocorrido até ontem. Por meio da assessoria, o prefeito de Curitiba disse "não ter nada para esconder", voltando a afirmar que sua prestação de contas à Justiça Eleitoral não contém irregularidades. Como exemplo de transparência, a assessoria de Richa disse que a gravação das conversas com Oriente foram encaminhadas sem cortes à Procuradoria Regional Eleitoral.

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